quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

As manifestações culturais e seu papel na sociedade

O papel das manifestações culturais

Tanto no campo individual quanto no campo social, as manifestações culturais se originam e se mantêm pela identificação de valores ou simplesmente pela tradição, fatores predominantes como hábitos culturais. Porém, há a arte popular desvalorizada e tratada por alguns como marginalizada, por servir de resistência cultural durante muito tempo a alguns grupos sociais excluídos.

A arte incomoda os poderosos, na medida em que exige vontades e direitos do povo, pois o artista faz parte deste e, muitas vezes, aponta novas idéias sociais que acabam sendo incompreendidas ou censuradas ao longo da história. No caso das manifestações culturais de uma forma geral, o povo que faz sua arte, mantendo a chama acesa de suas raízes, como forma de protesto ou simplesmente como auto-valorização e imposição de seus valores.

A apropriação abusiva nas manifestações culturais

Um problema constante é a comercialização desmedida em torno das manifestações culturais, que tem como consequência o desvirtuamento de sua intenção original. É impossível filtrar as mudanças que ocorrem na arte em geral, pois ocorrem aleatoriamente e de acordo com ideais diversos ou até mesmo adversos entre si, de forma regional ou universal. Porém, a questão parece estar longe de ideais concretos, mas perto da produção desses grandes eventos de forma mascarada e ao mesmo tempo atrativa como entretenimento.

Há uma enorme diferença entre abrir espaço para essas manifestações e vender midiaticamente esse meio de expressão popular como produto, direta ou indiretamente. Transformadas em produto, muitas vezes essas manifestações perdem sua força a medida que são comercializadas e acabam se estagnando ou sendo substituídas rapidamente por outro produto mais vendável. Um exemplo desse tipo de acontecimento é a confusão que muitas pessoas desinformadas fazem com a música caipira regional de raiz e a música sertaneja de hoje em dia.

terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

Olho na telinha...

A cultura acompanha a voz do povo, que se reflete no sentimento expressado pela arte. Na televisão, principalmente nas “grandes emissoras”, o que vemos não é exatamente a voz desse povo, mas na maioria dos casos, valores impostos da elite para a massa, ou seja, uma cultura de entretenimento imbecilizante, oriunda da filosofia do escape e, de outro lado, da dominação, como uma droga social.

Na TV, um fator predominante nesse tipo de propagação de valores é uso de imagens marcantes e violentas, misturadas ora ou outra com um toque de um erotismo utópico, muitas vezes cruelmente sarcástico em sua associação. Podemos ver estes elementos em qualquer programa de auditório, em que pessoas correm e quase se machucam para pegar notas de dinheiro jogadas aleatoriamente por um apresentador de TV. Tudo tratado com muita hipocrisia e aceitação.

É antiga a tradição de uma TV padronizada para hipnotizar e explorar a curiosidade do povo, que é vendida em troca do escape e da relação “emburrecimento – apatia”, propagando valores de forma parcial, inconcreta e, muitas vezes, difundindo falsos valores e modas passageiras, que não representam fielmente a voz desse povo, apenas domado por uma casca bem produzida, mas que raramente gera algum benefício para a massa em geral.

domingo, 21 de fevereiro de 2010

A dualidade na expressão artística

Nossa cultura, da música à literatura, foi sempre marcada por ideais políticos conflitando com vertentes mais “românticas”, que aparentavam certa apatia quanto às necessidades de mudança no meio social. Se do Tropicalismo ao Mangue Beat, a música brasileira mantinha-se como importante ferramenta de protesto, por outro lado, havia sempre o romantismo característico da Bossa Nova. Há também casos como o da grande cantora Nara Leão, que participou tanto da Bossa Nova – movimento do qual foi musa - quanto do Tropicalismo.

No campo das palavras, a tendência era quase sempre descrever o cotidiano, muitas vezes em tom de denúncia social. Das idéias de João do Rio, Lima Barreto e Machado de Assis, por exemplo, saíram crônicas, contos e escritos em geral de cunho mais político. Enquanto isso, sempre houve também quem descrevesse e revelasse a alma do ser humano, de forma introspectiva, porém não menos importante como ferramenta de reflexão, o que muitas vezes também era feito por escritores que se dedicavam ao âmbito social.

Em alguns casos, essa escolha temática tem haver muito mais com a necessidade de expressão e a inspiração que vêm à mente do artista por sua reflexão e visão do mundo do que necessariamente uma visão política consciente.

É nesse ponto que a arte se torna abrangente e abre espaço para uma gama infinda de reflexões sobre o ser humano e o que o cerca, entre problemas para serem discutidos e prazeres. Porém, a arte sempre teve uma função social importante em qualquer sociedade, seja para manter valores intactos ou repensá-los, seja para reformas sociais.

Enfim, como disse certa vez Milton Nascimento, "o artista deve ir onde o povo está".

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

Cultura e memória: Entre tradições e revoluções!



Todo povo precisa da cultura como meio de tradição ou revolução. Preservar os bens culturais é papel fundamental de qualquer sociedade, seja como expressão de valores sociais, seja pela inovação ao criar, romper e recriar movimentos artísticos como expressões populares retratadas pelo sentimento transposto ou transcrito através das obras de arte, quando essas se espelham na realidade social ou em um questionamento derivado da mesma. Muitas vezes, servem, também, durante muito tempo, para manterem ideais intactos de resistência de determinado grupo excluído socialmente ou politicamente.

Da capoeira ao samba, a cultura brasileira apresenta diversos movimentos socioculturais ao decorrer de sua história. Alguns destes ganharam tanta expressão e força popular que viraram tradicionais, algo inevitável para um país com uma cultura tão rica, abrangente e miscigenada como o Brasil.

Embora alguns tentem – preconceituosamente, por radicalismo ou até mesmo pela falta de conhecimento – convencer o povo de que os movimentos revolucionários na arte são marginalizados, muitas vezes são estas manifestações culturais que dão real voz ao interesse popular de um povo historicamente usufruído e explorado, que tem no sangue a revolução que envolve suas artes, como uma voz silenciosa que grita em busca de justiça, resistência e liberdade.

sábado, 13 de fevereiro de 2010

Carnaval na cidade fantasma...

Minha cidade até que tem Carnaval!... Alguns poucos blocos de rua transitam em alguns pontos, mas não há aquela folia dos grandes carnavais nem o movimento descontrolado pelas ruas. Logo a cidade do MAC (Museu de Arte Contemporânea ou o famoso “disco voador”, para os leigos e turistas), cidade de grandes artistas (os que fazem arte) e personalidades de diversas áreas!

Os moradores da cidade dizem que o carnaval aqui é fraco, geralmente sem saber os motivos que levam a cidade a um certo desânimo nesse período que é um dos mais festivos para outras cidades. Aliás, pensando bem, isso é realmente um enigma, pois a terra de Araribóia é propícia a um bom Carnaval, pois tem belos cartões postais, como suas belas praias, e é uma cidade relativamente grande.

Porém, o Carnaval aqui parece ser restrito a festas em clubes, a quem torce pela Escola de Samba local mais famosa Viradouro pela TV no desfile das Escolas de Samba e alguns entusiastas que vagam pelas ruas tranqüilas de Niterói, procurando um pouco de animação gratuita em alguns blocos e ruas estreitas que, ainda que com dificuldade, mantêm-se dignamente fiéis ao espírito do Carnaval.

A impressão ao passar o Carnaval aqui é a de que o motivo talvez seja interno e parta da tradição do próprio povo local em viajar para outros locais no período festivo, dizendo que “o Carnaval de sua cidade é fraco” ou que “não existe”. Há, também, quem prefira a tranquilidade de uma cidade fantasma.

Apesar de tudo, tenho que admitir que tais afirmações fazem sentido. Niterói é uma cidade que perdeu, há muito tempo, força no Carnaval de rua. Pode-se dizer que a tradição carnavalesca nas ruas de Niterói anda já cansada com a falta de resposta de seu público, ou até mesmo que tenha se aposentado.

As pessoas se esquecem que o Carnaval de rua de uma cidade se faz com as próprias mãos do povo, já que é teoricamente uma festa popular e democrática. Enquanto as pessoas daqui não compreenderem o que representa o Carnaval e o que ele pode gerar, como o investimento em turismo que pode ser revertido para melhorias sociais na cidade, por exemplo, o Carnaval de Niterói estará sempre esperando, talvez nostalgicamente, que volte à ativa algum dia.

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

Show do Living Colour (Outubro de 2009)

O Living Colour demonstrou, em um show intenso, que a carreira da banda vai bem além dos hits, como “Cult of Personality” e “Glamour Boys”, que não ficaram de fora. O Circo Voador, na Lapa, ficou agitado e, em algumas situações, como na música “Open Letter To A Land Lord”, teve seu público emocionado, em meio a um repertório entre versões diversas e interessantes para alguns clássicos e canções que, apesar de não terem alcançado o título de hit, têm qualidade inegável.

Desde o início do show, o público foi bem receptivo, demonstrando um sincero interesse em ouvir a banda, que se caracteriza sempre por misturar diversos ritmos em suas músicas, como o Hard Rock, ritmos caribenhos (como o que marca a música já citada “Glamour Boys”), Pop, ritmos à “Black music”, entre outros.

A banda demonstrou, ao decorrer do show, toda a empolgação de tocar no Brasil e o envolvimento entre banda e público foi marcado por um show receptivo por ambas as partes.

De músicas mais pesadas, como em “Time’s Up”, “Go Away” e a famosa “Type”, a músicas mais tranqüilas e viajantes, como na já citada “Open Letter to A Land Lord”, o repertório abrangeu várias fases da banda. A maior parte das canções recebeu uma roupagem ainda mais pesada, porém altamente bem vinda, do que nas versões originais, graças principalmente à densidade das bases do guitarrista Vernon Reid.

Os solos de cada instrumentista foram, também, um show à parte e serviram para dar um gás para as músicas seguintes no show.

O Bis, tão bem executado como o restante do show, também empolgou em cheio aos fãs, quando foi tocada a balada “Love Rears It’s Ugly Head”, um cover para “Crosstown Traffic” (Jimi Hendrix) e, em seguida, também um cover para “Sunshine Of Your Love”, do Cream.

Um show nada óbvio e muito empolgante, eclético e muito bem executado pelos excelentes músicos que formam o Living Colour, entre eles o renomado guitarrista Vernon Reid e o vocalista inconfundível Corey Glover, que demonstrou ótima forma em todas as músicas, provando sua alta competência vocal depois de tantos anos de carreira.

Clássico remasterizado: 'Tudo Foi Feito Pelo Sol' (Mutantes, 1974)


Pouca gente se lembra ou ao menos conhece a história da fase mais progressiva dos Mutantes, que se inaugurou após a saída de Rita Lee e Arnaldo Baptista (teclados) da banda. Sérgio Dias (guitarra) poderia ter desistido da empreitada, já que, com o tempo, os membros que restariam - o baterista Dinho e o baixista Liminha, este que chegou a compor quatro das oito faixas do álbum em parceria com Sérgio Dias – saíram da banda.

O disco ‘Tudo Foi Feito Pelo Sol’ foi marcado por um ambiente “carioca” na banda. Na época, entre as gravações do disco, que marcou o Rock Progressivo nacional, a banda transitava pelo Jardim Botânico e por um sítio em Itaipava.

Transbordando arranjos psicodélicos e marcantes, ora sutis ora intensos, como nos dedilhados hipnóticos e galopantes e solos viajantes de Sérgio Dias, nas camadas de teclado do mineiro Túlio Mourão, em meio aos graves marcantes do niteroiense Antônio Pedro de Medeiros e o ritmo preciso e criativo do baterista seu conterrâneo Rui Motta, a banda empolga em cheio, principalmente a quem é fã de Rock Progressivo. Porém, as faixas são recheadas de elementos diversos que agradam em cheio fãs de qualquer estilo que engloba a nata do Rock psicodélico dos anos 70 em geral.

Embora as canções se mostrem enriquecidas com uma intensa força instrumental, as letras e o vocal espontâneo de Sérgio Dias também marcaram presença nesse disco dos Mutantes, que chegou à marca de quase 30 mil cópias vendidas.

O sucesso de crítica e público a partir do álbum mostrou que os Mutantes, apesar de trilharem um caminho sonoro diferente do anterior, conseguiram driblar as dificuldades através do talento e da criatividade em canções empolgantes.

Vale lembrar que a versão remasterizada em CD traz três faixas bônus, entre elas a polêmica “Cavaleiros Negros”, que, na época, foi modificada para “Cavalinhos Negros” devido à censura.

terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

Resenha: "A Rua" (crônica de João do Rio que integra a obra "A Alma Encantadora das Ruas")

Descrever a alma carioca através das ruas do Rio, fossem elas urbanas ou suburbanas, definitivamente, foi uma qualidade nata de João do Rio, cronista carioca que, no início do Século XX, teve coragem e talento de sobra para descrever o cotidiano do Rio de Janeiro, sempre com um olhar crítico, que muitas vezes chegava a ser sarcástico. Porém, quanta maestria! Suas crônicas são um verdadeiro aprendizado de Jornalismo Literário e, hoje, porque não, de História.

A poesia com que João do Rio definiu as ruas e as diferenças entre seus frequentadores demonstra uma relação de intensa sensibilidade ao que poderia passar despercebido por muitos, como nos seguintes trechos:

“Algumas dão para malandras, outras para austeras; umas são pretensiosas, outras riem aos transeuntes e o destino as conduz como conduz o homem, misteriosamente, fazendo-as nascer sob uma boa estrela ou sob um signo mau, dando-lhe glórias e sofrimento, matando-as ao cabo de um certo tempo.

Oh! Sim, as ruas têm alma! Há ruas honestas, ruas ambíguas, ruas sinistras, ruas nobres, delicadas, trágicas, depravadas, puras, infames, ruas sem história, ruas tão velhas que bastam para contar a evolução de uma cidade inteira, ruas guerreiras, revoltosas, medrosas, spleenéticas, snobs, ruas aristocráticas, ruas amorosas, ruas covardes, que ficam sem pinga de sangue...”

Ao decorrer da crônica, a relação humana com o ambiente urbano é explorada de forma metafórica e poética, porém eficientemente direta, com poder de síntese em boas idéias.

A impressão que se tem ao ler a obra de João do Rio, seja nesta crônica, como em outras de sua autoria, é a de que o cronista explorava fielmente uma linguagem popular para a época, tornando seus escritos acessíveis e, ao mesmo tempo, belos e intensos.